Pró-Etanol ou Pró Pré-Sal?
Guilherme Nastari*
O ano de 2008 foi repleto de fatos bem peculiares. Foi iniciado com um caráter expansionista jamais visto. O etanol voltava a ser a grande estrela do mercado automobilÃstico e de nações preocupadas com suas dependências energéticas.
Frequentemente, o etanol brasileiro foi pauta de discussões internacionais e, em alguns casos, até citado como o caminho para a diversificação da matriz energética mundial. O governo Lula, de forma bem aberta, hasteou a bandeira PRÓ-ETANOL.
Neste cenário de crescimento muitos dos insumos estavam com relação desbalanceada de oferta e demanda, ocasionando assim impactos sensÃveis nos preços dos principais fatores de produção, como fertilizantes, máquinas agrÃcolas e diesel.
O volume de vendas de autoveÃculos mudava completamente de patamar. Na década de 80, quando houve um expressivo aumento da frota a álcool, culminando com a crise de abastecimento de 1989, as vendas mensais não ultrapassavam 60 mil veÃculos. Em 2002, a venda média mensal foi de 117 mil veÃculos. Em abril de 2008, observavamos um patamar quatro vezes aquele registrado na década de 80.
Nesta mesma época o preço do petróleo estava bem acima do que estamos observando atualmente, com projeções ainda maiores. Grande parte dos analistas econômico-financeiros estimava que este preço pudesse atingir entre US$ 150 e US$ 200 por barril, no final de 2008.
Mesmo com aquele cenário expansionista, grande parte dos produtores brasileiros operavam abaixo do custo de produção. Para uma taxa de câmbio de 2,10 R$/USD o custo de se produzir álcool anidro no Brasil, em centavos de dólar por libra peso (cts/lb), era de 11,81. O interssante é que estavamos observando tamanho crescimento em um mercado temporáriamente sem acumulo renda.
Certamente os produtores estavam motivados pelo aumento significativo da demanda interna de álcool e pelos potenciais ganhos futuros deste mercado. O reflexo desta expectativa aumentava o anseio do produtor de se alavancar financeiramente. Em cenários de expansão econômica, este posicionamento estratégico não é tão arriscado. O Brasil tinha atingido grau de investimento, e os paÃses emergentes estavam em alta, fortificando ainda mais esta atitude arrojada de expansão.
Atualmente o cenário é bem diferente. A crise de liquidez mundial chegou e esta afetando fortemente o maior fornecedor de açúcar e álcool do mundo. A dependência de capital de curto prazo faz com que grande parte dos produtores tenham que se posicionar em piores situações e, em alguns casos, até colocar em risco a remuneração da safra seguinte.
No setor sucroalcooleiro a necessidade de capital de giro no inÃcio da safra faz com que os produtores busquem no sistema bancário o folego necessário para que as operações comecem em tempo e situação saudável.
Em momentos como este é necessária uma politica de crédito bem estruturada por parte das instituições financeiras públicas e privadas. O apoio que está sendo demandado atualmente certamente será recompensado em futuro próximo. Os fundamentos dos mercados de açúcar e álcool no Brasil e no mundo estão consolidados e não foram afetados por este momento conturbado.
A demanda interna por álcool combustÃvel, apesar de menos aquecida, é crescente. A frota flex representa 87% dos novos licenciamentos e um consumo médio mensal de 1,7 bilhão de litros etanol por mês, com expectativa de crescer 2,1 bilhões de litros na safra 2009/10.
No mercado de açúcar o ciclo de excesso de oferta terminou. Entramos num perÃodo de dois anos de déficit, com um ex-exportador, a Ãndia, ditando novamente as tendências deste mercado. A expectativa da DATAGRO para o mercado mundial de açúcar para as safras 08/09 e 09/10 são déficits de 3.8 e 5.0 milhões de toneladas, respectivamente.
Em contrapartida, os números publicados no Plano Decenal de Expansão de Energia – PDE 2008-2017, estão mais para PRÓ PRÉ-SAL. Dos 767 bilhões de reais a serem investidos até 2017, apenas 6,5% estão destinados para a produção e infra-estrutura de biocombustÃveis. Já para petróleo e seus derivados, estes investimentos somam 69,9% do total.
Necessitamos de polÃticas e ações de desenvolvimento de mercado internacional. Não adianta nada ser os melhores produtores de alguma coisa que não é comercializada. O Brasil precisa ensinar paÃses em desenvolvimento a produzir etanol barato e competitivo. Parar de criticar o etanol de outras fontes, como o milho nos Estados Unidos, é fundamental para a consolidação do mercado global de etanol.
Os investimentos no Pré-Sal são necessários para que o Brasil continue extraindo petróleo, e seja auto-suficiente. Sem investimento, a extração cai 10% a cada ano. É exatamente aà que reside a grande vantagem do etanol, que exige investimento uma só vez, e reproduz a produção a cada ano com custos de manutenção já embutidos no custo de produção.
A trégua que o preço do petróleo nos dá hoje não deve arrefecer o empenho e o reconhecimento que existe sobre as vantagens de se produzir etanol de biomassa de forma competitiva, em larga escala, e com diversificação de origens. Embora os investimentos estejam bem mais para o Pró Pré-Sal, a estratégia de longo prazo deve continuar sendo a de privilegiar o Pró-etanol.
Guilherme Nastari é economista da DATAGRO. |