Expansão e Incertezas
Guilherme Nastari*
A expansão do setor sucroalcooleiro no Brasil está relacionada com o aumento do consumo de álcool, turbinado pela frota flex. Produtores brasileiros fazem de tudo para elevar a oferta, às vezes a taxas acima do sustentável no longo prazo. A taxa média de crescimento da oferta de ATR entre 2000 a 2008 no Centro-Sul foi de 11,7% e para o Brasil de 10,2%.
Com moagens quinzenais, na safra 08/09, entre 33 e 38,5 milhões de toneladas de cana e médias diárias entre 2,2 e 2,6 milhões, o Brasil moe a cada dois dias o equivalente a toda produção da República Dominicana, o segundo maior produtor da América Central e Caribe. Poucos dias de chuva e paralisação da moagem do Brasil têm efeito enorme sobre o mercado internacional, impactando a oferta total de ATR. Com isso, a previsão de safra fica cada vez mais dependente do clima. Tão, ou mais relevante, do que a informação fornecida pelas fotos de satélite sobre o total de cana disponÃvel, e sua qualidade, o que importa é a previsão do que será efetivamente processado, numa economia canavieira que é responsável por 32% da cana do mundo.
Para uma taxa de câmbio de 2,10 R$/USD, o custo atual de produção de álcool do Brasil, em centavos de dólar por libra peso (cts/lb), é de 11,81. Nestes nÃveis, grande parte dos produtores brasileiros operou nos últimos 12 meses abaixo do custo de produção. A grande questão: por que se observa tamanho crescimento se este mercado não está acumulando renda?
Por certo, os produtores estão motivados pelo aumento significativo da demanda interna de álcool e pelos potenciais ganhos futuros. O reflexo desta expectativa aumentou o anseio do produtor, em quase sua totalidade, de se alavancar financeiramente nas safras passadas. Em cenários de expansão econômica, tal posicionamento estratégico não é tão arriscado. O Brasil atingindo grau de investimento, e os paÃses emergentes em alta fortificavam ainda mais esta atitude arrojada de expansão.
Mas aconteceu o que não podia acontecer. A crise mundial de liquidez chegou, e parece que não vai passar tão cedo. Muitos dizem que o Brasil não está a salvo da onda devastadora do hemisfério norte, mas isso pode ser apenas uma questão de tempo.
No setor sucro-alcooleiro a necessidade de capital de giro no inÃcio da safra faz com que os produtores busquem fôlego no sistema bancário para garantir as operações. Se a crise de liquidez afeta pouco a economia atual, por certo impactará as safras seguintes com, por exemplo, na não-prorrogação de créditos.
Em paralelo, cresce a vinda de comitivas estrangeiras ao Brasil, interessadas em potenciais investimentos de longo prazo. A consolidação do etanol como substituto de combustÃveis fósseis motiva estes investidores a visitar o PaÃs. Em conferências como a da DATAGRO, observa-se mais de 30 delegações de paÃses interessados em conhecer como se desenvolve o fornecedor marginal de energia renovável para o mercado mundial.
O potencial de consolidação do setor é cada vez maior. Uma indústria fragmentada, com gestão corporativa ainda em estruturação, faz com que investimento relativamente baixo transforme a estrutura produtiva e comercial dos mercados de açúcar e álcool. Nossa indústria é pulverizada, com oportunidades de consolidação ainda por vir. Moendo 45 milhões de toneladas, o maior grupo produtor representa hoje só 8,2% de participação de mercado. Isso equivale a 4 vezes o total do maior produtor de cana da América Central e Caribe, Cuba.
Surgirão investimentos de participantes sem histórico ou interesse no setor sucro-alcooleiro, mudando escala e posicionamento financeiro do mercado de açúcar e álcool. Fundos soberanos ainda não começaram a investir em energias renováveis, mas estão rodeando o Brasil. Não será esta a resposta à pergunta acima? E qual será o valor dos ativos deste mercado?
As restrições serão menos de capital e mais de licenciamento ambiental e social. Apenas empresas preparadas sócio-ambientalmente terão acesso ao mercado mundial.
Em suma, mesmo com esse cenário um pouco conturbado, acredita-se que o setor seguirá num processo de expansão, no entanto menos vigoroso, trazendo investimentos e participantes novos. Quem mensurar a relação tempo-investimento com precisão estará preparado para superar os momentos de estiagem financeira e colocar-se à frente da nova fase que está por vir.
* Guilherme Nastari – Analista Economico - DATAGRO
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