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Em defesa do consumidor

Apesar do Código de Defesa do Consumidor – CDC brasileiro ser, de fato, um dos mais perfeitos do mundo, não deixa de ser injusto em algumas situações. Uma iniciativa que, por certo, nasceu não somente inspirada em modelos externos, mas, principalmente, por conta da própria experiência vivenciada pelos consumidores no país.

No desejo de ser o mais abrangente possível, o CDC tratou de instituir o conceito da Responsabilidade Solidária de forma genérica, sem ater-se a peculiaridades e nem criar exceções, baseando seus princípios essencialmente nas atividades comerciais.

Diferentes entendimentos deveriam existir em algumas situações. Não sei precisar qual é a totalidade de situações que merecem ser alvo de entendimentos específicos. Porém, estou certo de que, pelo menos, três setores (imobiliário, seguro e turismo) clamam por devida atenção.

Analisemos, por exemplo, a situação de uma pequena corretora de imóveis escolhida para comercializar todas as unidades de um edifício e que, após ter efetuado a venda e já na fase de construção, a construtora responsável pelo empreendimento venha a quebrar. Essa corretora teria meios para ressarcir os compradores? Evidentemente que não. Para tranquilidade dos corretores a Justiça tem desconsiderado a responsabilidade solidária fazendo com que os interessados busquem ressarcimento habilitando-se nas concordatas ou falências.

Outra situação que podemos imaginar, mas que na verdade creio jamais tenha ocorrido -- pelo menos nada encontrei na jurisprudência consultada –, seria o caso do corretor de seguros intermediar a venda de uma apólice para uma indústria que venha a sofrer com um incêndio e, por hipótese, a seguradora também entre em processo de falência e não pague o prêmio. Teria o corretor condições de ser responsabilizado?

Especialmente no setor de viagens e turismo, a perversa generalização do conceito de responsabilidade solidária criou uma situação extremamente cruel, quando entende que os agentes de viagens que venderam passagens de uma empresa aérea, que encerra suas atividades, sejam responsabilizados.

Curioso notar que, ao contrário dos outros exemplos citados acima, as empresas aéreas que nos últimos anos deixaram de transportar seus passageiros, sem exceção, deixaram de seguir o caminho normal e legal. Ou seja: não pediram concordata ou falência, como fazem as construtoras ou seguradoras. As empresas aéreas, simplesmente, avisaram que interromperam operações, como foram os casos das companhias PANAM, BRANIFF, EASTERN e, agora, em 2012, da PLUNA.

Ganha contornos especiais o caso da companhia aérea PLUNA; uma vez que o fato dela ter paralisado suas atividades foi uma determinação do governo uruguaio. Pior que isso, em momento algum as autoridades responsáveis esboçaram apresentar alternativas para fazer frente às dificuldades e aos prejuízos causados a milhares de passageiros que, sem prévio aviso, deixaram de ser atendidos. A intempestiva comunicação simplesmente foi feita e, de pronto, a PLUNA suspendeu as operações.

Como poderiam as agências de turismo prever esse fato, considerando que a oferta de passagens pela PLUNA é pública (nem sequer anunciada pelas agencias) e a empresa estava autorizada pelo governo brasileiro, através da Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, a operar? Em última análise, cabe à ANAC averiguar as condições financeiras das empresas que autoriza a prestar serviços em território brasileiro!

A PLUNA deixou de atender aproximadamente 10.000 passageiros com bilhetes já adquiridos, volume este que, levando em conta a prevista solidariedade, certamente acarretou e acarretará sérios problemas financeiros para um bom número de agências, situação que certamente terá desdobramentos futuros.

Como sabemos, a PLUNA era uma pequena empresa controlada pelo governo uruguaio que operava voos de curta distância entre Uruguai, Brasil, Argentina e Chile e que, por ordem deste mesmo governo, encerrou suas operações. Imaginemos, agora, se tal situação, por acaso, viesse a ocorrer com uma empresa aérea de grande porte, o que não é nada impossível, visto as grandes perdas que apresentam seus balanços, a cada ano. Nos dias atuais, com a demanda do transporte aéreo muito aquecido, as grandes empresas acumulam centenas de milhares de passagens comercializadas e ainda não utilizadas.

O que aconteceria com as agências de turismo em nosso país, caso elas tivessem sido do mesmo modo responsabilizadas e penalizadas quando a VARIG, que deixou cerca de 6 milhões de usuários sem transporte? Não restam dúvidas, de um dia para o outro, todas, absolutamente todas as agências de turismo do Brasil estariam acabadas.

No caso da Varig, o Sindicato das Empresas de Turismo do Estado de São Paulo – SINDETUR-SP, prevendo a eminente quebra da empresa, solicitou do então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, assistido pelo também ex-ministro do Turismo, Walfrido dos Mares Guia, solução ao impasse.

À época, caso o SINDETUR-SP alertasse formalmente as agências de turismo sobre o perigo de comercializarem as passagens aéreas da VARIG, em fase pré-falimentar – ainda que desnecessário; pois toda a mídia já previa o fato – ele poderia ser do mesmo modo responsabilizado por ter contribuído para precipitar a sua falência. Porém, caso não o fizesse, estaria omisso às terríveis consequências que recairiam sobre os agentes de turismo.

Mas, por sorte, a então recém-criada ANAC, sob a presidência de Milton Zuanazzi, um técnico oriundo do setor de turismo, que delegou a solução do problema a quem entendia do assunto, o Gerente de Operações Internacionais, na época, o competente Coronel Valdir Padilha, que acabou por obrigar às congêneres atenderem e transportarem as vítimas da falência da VARIG.

Até gora, contudo, a ANAC nada fez a não ser informar que pediu na Justiça o arresto de bens da companhia aérea PLUNA no Brasil. Que bens? Qual foi a atitude dela ANAC diante do governo uruguaio? Qual foi sua atitude para proteger os interesses dos consumidores? Qual foi sua atitude junto ás congêneres?

É por isto que, de fato e de direito, nós responsabilizamos a ANAC, cobrando dela que encontre uma solução adequada ao ressarcimento dos consumidores e das agências de turismo.

Esperamos, também, com este exemplo, que a justiça e os Procons entendam que nós, agentes de turismo, não podemos ser responsabilizados por tamanha irresponsabilidade.

O Sindetur-SP já tomou as providências cabíveis ao seu alcance, e aguarda manifestação da Justiça.

Eduardo Vampré do Nascimento - Presidente do Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São Paulo - SINDETUR-SP

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