Açucar na China ainda fortemente influenciado por políticas de governo e uso de sacarina
AÇÚCAR NA CHINA AINDA FORTEMENTE INFLUENCIADO POR POLÍTICAS DE GOVERNO E USO DE SACARINA
Plinio Nastari
A produção de açúcar na China registra queda pela segunda temporada consecutiva. No total, 10,74 milhões de toneladas de açúcar foram produzidas na safra 2009/10 que encerra oficialmente em setembro próximo. O recúo de 13,53% sobre a safra anterior ocorre essencialmente devido ao clima desfavorável. Como resultado, projeta-se um déficit doméstico de 3,59 milhões de toneladas neste ano.
Apesar disso, a importação chinesa de açúcar não cresceu e nem deve crescer tanto quanto como se poderia imaginar diante desse elevado déficit. Cabe aqui, portanto, entender os motivos, já que existem particularidades do mercado chinês que precisam ser conhecidas antes de serem adotadas expectativas otimistas sobre o potencial de importação de açúcar para os próximos anos.
A produção chinesa de açúcar está alicerçada fundamentalmente em cana-de-açúcar cultivada em províncias localizadas no sul do país, cabendo à beterraba açucareira uma pequena parcela de 5,6% do total produzido em 2009/10.
A estiagem, que começou no segundo semestre de 2009, refletindo uma combinação de falta de chuvas e temperaturas elevadas, afetou as principais regiões produtoras de açúcar, a exemplo de Guangxi e Yunnan, com algumas áreas tendo recebido 90 porcento menos chuvas do que o normal. Como resultado, houve queda na disponibilidade de materia prima, o que provocou o encerramento antecipado da safra 2009/10.
Cerca de 7,10 milhões de toneladas de açúcar, ou 65,9% da produção nacional, foram produzidas em Guangxi, 528 mil toneladas menos que em 2008/09.
Em Yunnan, segunda maior província produtora de açúcar, 80% dos canaviais foram afetados pela seca, o que resultou em uma perda de 4,5 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, produzindo 1,77 milhão de toneladas de açúcar, o que representa 463,7 mil toneladas menos que em 2008/09.
A terceira maior área plantada com cana-de-açúcar, na província de Guangdong, apresentou cultivo de 127 mil hectares em 2009/10 permitindo uma produção de 857,7 mil toneladas de açúcar, queda de 19% sobre a safra anterior.
Na província de Xinjiang, a maior produtora de beterraba açúcareira, o processamento em 2009/10 caiu em torno de 10% para 3,22 milhões de toneladas. Em segundo lugar, vem a província de Heilongjiang responsável por 98,9 mil toneladas de açúcar de beterraba, com forte queda de 186 mil toneladas ou de 65,3% em relação à campanha passada.
Apesar da retração da produção interna nas últimas duas temporadas, o governo chinês tem adotado uma política deliberada de perseguir a auto-suficiência. A manutenção de estoques governamentais, o controle das importações, e a produção e uso de sacarina pela indústria alimentícia, são os seus principais instrumentos.
A China é um grande consumidor e produtor mundial de sacarina e também de outros adoçantes sintéticos que no mercado industrial concorrem efetivamente com o açúcar. O governo chinês iniciou um controle sobre a oferta de sacarina, chegando inclusive a fechar algumas fábricas, de maneira a fomentar a produção doméstica de açúcar, sob o argumento de melhorar a saúde pública. Mas em períodos em que os preços do açúcar se tornam mais elevados devido ao déficit no balanço interno, o governo volta a estimular o uso de adoçantes artificiais, o que reduz em boa proporção a necessidade de aquisição de açúcar no mercado externo.
A potencial demanda de açúcar na China se deve mais pelo tamanho de sua população e de sua renda crescente. Quase todo açúcar é consumido indiretamente em bebidas e alimentos processados, que pode ser por ora substituído por adoçantes artificiais, sendo baixo o consumo direto. O consumo per capita na China é hoje de 11,1 kg por habitante, enquanto a média mundial é de 25 kg por habitante.
Quanto ao controle das importações, o volume importado não chega a representar uma parcela substancial do consumo. Para a temporada 2009/10, projeta-se que a China importe 1,11 milhão de toneladas de açúcar, contra 1,02 milhão em 2008/09, ou apenas 7,75% do consumo doméstico estimado para o período.
Quando a China entrou na OMC foi acordada uma quota de importação de 1,6 milhão de toneladas, que em 2004 foi aumentada para 1,95 milhão de toneladas sob uma tarifa de 20%, que sobe para 65% para o volume excedente. Além disso, a China supre maior parte de suas importações através de um acordo de fornecimento com Cuba, de 400 a 450 mil toneladas anuais.
Para o balanço de 2010/11, projeções preliminares apontam que as importações de açúcar possam crescer 15,3% para 1,28 milhão de toneladas, mesmo volume importado em 2007/08. Já a produção de açúcar deve apresentar crescimento de 10,7% de 10,74 milhões para 11,89 milhões de toneladas, embora ainda abaixo do consumo doméstico.
Persistindo este quadro, apesar do seu enorme potencial, as perspectivas da China se tornar um grande importador são mais firmes para o etanol do que para o açúcar.
Plinio Nastari é presidente da Datagro Consultoria.